A Escola Estadual Professor Arlindo Fávaro, incentivada pelo docente de sociologia da mesma, Jean Doniseti Bortolucci, criou duas disciplinas eletivas com foco na observação de aves. As aulas fazem parte da proposta do Novo Ensino Médio, que busca dinamizar a relação entre as disciplinas diversificadas e os itinerários formativos com o projeto de vida de cada aluno.
“Os professores procuram elaborar diferentes disciplinas eletivas, muitas vezes, a partir de habilidades que cada um possui, mas que não podem ser exploradas em disciplinas convencionais. A ideia é que elas possam de alguma forma apoiar as escolhas futuras dos alunos em termos pessoais, sociais e/ou profissionais. Essas disciplinas têm um período curto de duração, de apenas um semestre. Sendo assim, procurei desenvolver esse projeto com nossos alunos a partir de algo para o qual me dedicava: a atividade de observação de aves”, conta Jean.
Segundo o professor, a proposta surgiu por diversas razões, como utilizar a ligação forte dos jovens com a tecnologia de maneira produtiva, mostrar a eles a natureza farta presente no ambiente da escola, possibilitar a aproximação dos estudantes à fotografia, incentivar a preservação ambiental e expor para o público geral a diversidade de aves presentes no local.
“Num mundo em que a tecnologia tem tomado o espaço de afazeres muito importantes para o ser humano, por que não utilizar a tecnologia, no caso das câmeras e programas de edição de fotos, para que os alunos passassem a observar o seu entorno de uma forma mais contemplativa e mais crítica de sua realidade? Mostrar a riqueza de vida que existe na nossa escola. Além de 71 espécies observadas em dois anos e meio por mim, há anfíbios (a escola possui uma área com duas nascentes perenes que formam um dos braços de um córrego que atravessa boa parte da cidade), um teiú, uma família de gambás e muitos insetos, como borboletas, abelhas e aranhas. Temos na cidade um curso de fotografia oferecido pela ETEC. Sabemos que a fotografia oferece muitas possibilidades profissionais e, por isso, a ideia era despertar primeiro o gosto pela fotografia (objetivo que foi atingido com sucesso), para que no futuro o aluno avaliasse se poderia se tornar uma oportunidade de trabalho. Também desenvolver um olhar estético e perceptivo para questões sociais e ambientais, aliado à preservação efetiva do local, a partir do plantio de mudas de árvores, para aumentar a população da avifauna na escola. Por último, mostrar para a comunidade escolar e para a comunidade em geral a diversidade de aves que está muito perto de todos nós”, explica o professor, que diz ser ligado à natureza desde criança por ter morado em um sítio.
Para que belos registros fossem possíveis, a compra de máquinas fotográficas era necessária. Jean apresentou a proposta das aulas à direção da escola, a gestão gostou da ideia e adquiriu três câmeras super zoom com a verba destinada às escolas públicas pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
“Quando começamos a trabalhar na escola somos orientados sobre as possibilidades oferecidas até mesmo em termos de aquisições de tecnologias que podem ser feitas. Apresentei o projeto de maneira informal e a gestora achou bastante pertinente por avaliar o possível alcance do que seria desenvolvido, e, no mesmo ano, comprou uma das câmeras. Depois que a máquina chegou, a gestão escolar constatou sua versatilidade e vislumbrou que, além deste projeto específico, outros projetos poderiam utilizar a fotografia como eixo. Sendo assim, no primeiro semestre de 2022, mais duas câmeras foram adquiridas”, afirma Jean, que é formado em Ciências Sociais pela Unesp.
As aulas
Desde então, foram realizadas duas disciplinas eletivas com foco na observação de aves para alunos de 15 a 18 anos de idade, dos três anos do Ensino Médio. No segundo semestre de 2022 a aula contou com a participação voluntária de 18 alunos. A adesão foi tamanha que, no primeiro semestre de 2023, 26 estudantes quiseram participar do projeto.
“O interesse dos alunos foi aguçado, principalmente, porque a disciplina oferecia alguns eixos: o trabalho de campo ao fotografar as aves e plantar árvores, o da pesquisa, para obter informações sobre os animais, a edição de fotos e a escrita do livreto ‘A beleza das aves – um olhar diferente do que nos cerca’, que foi impresso como produto final da eletiva. Claro, a grande maioria queria fotografar. E foi fabuloso observar o quanto se apaixonaram pela atividade. Bastaram duas semanas para que os alunos começassem a compartilhar o que viram num sítio que visitaram, das aves que viram em determinada avenida da cidade ou perto de suas casas. Passaram a prestar atenção na vocalização dos pássaros. Alguns alunos vieram me contar que viram ‘uma ave vermelha muito bonita’ do outro lado da avenida em que a escola margeia, um príncipe. Depois que fotografavam, muitos alunos queriam mostrar para alguns professores o registro que fizeram. E a parte mais difícil era conseguir tirar a câmera da mão deles ao final da aula. Um aluno, por exemplo, passou a fazer registros de flores e a identificá-las a partir de um aplicativo, para postar em uma rede social. Alguns, inclusive, me pediram mudas para plantar nas casas deles ou em praças públicas”, relata.
Jean conta que o mais legal de todo o projeto foi ver como todo o corpo escolar se uniu para que o projeto desse certo. “Esse trabalho só foi possível porque muita gente abraçou a ideia. Os alunos, funcionários e professores doavam e colocavam frutas para abastecermos os comedouros colocados em lugares estratégicos”, valoriza.
Foram 60 registros em dois semestres de aulas que aconteciam às quintas-feiras durante apenas 90 minutos. Segundo o educador, a ideia era que as aulas eletivas completassem pelo menos um ano, para que também fosse possível registrar espécies migratórias. “Destaco os registros de uma fêmea e de um jovem de sanhaço-papa-laranja. Recentemente, teve uma reportagem do Terra da Gente dessa espécie por ela ter aparecido em Indaiatuba. Pelo que consigo perceber no mapa de registros do Wikiaves, a cidade de Leme está entre as cinco cidades mais ao norte do país com a presença dessa espécie. E o detalhe: apareceu na nossa escola e os registros foram feito pelos alunos”, ressalta. (Com informações de G1)